Eugênio Nascimento – Jornalista
-No último dia 03 de abril foi lembrado por segmentos da Igreja Católica em Sergipe os 50 anos da morte do primeiro arcebispo metropolitano de Aracaju, dom José Vicente Távora. Era um cristão muito próximo dos interesses populares e, talvez por isso, mereceu mais destaques as lembranças e homenagens dos religiosos que seguem esse alinhamento dentro e fora da igreja.
D. Távora, era um pernambucano, de família tradicional, que fez a opção pelos pobres e nessa condição atuou como religioso progressista e sem bens. Ele assumiu a Arquidiocese que comanda Aracaju e municípios circunvizinhos no dia 22 de março de 1958 e desde então engrossou as fileiras na luta pela construção de uma igreja progressista no solo sergipano. Entre os seus primeiros passos como arcebispo, lembra-se muito bem que atuou no sentido de viabilizar a criação da CNBB e que esteve no Concílio Vaticano II e na Conferência de Medellín.
O seu legado não morre na luta pela criação da Conferencia Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Cresce com ele. D. Távora garantiu a continuidade, para o povo de Sergipe Del Rey, o Serviço de Assistência à Mendicância (SAME), a Rádio Cultura de Sergipe, o Colégio Arquidiocesano, a Casa da Empregada Doméstica/Casa Santa Zita. Merece também ser destacada a criação das Dioceses de Estância e Propriá. Aproximou da igreja os trabalhadores rurais, os jovens, os operários e outros segmentos pobres da sociedade. Fortaleceu as ações do Movimento de Educação de Base (MEB) no Estado.
Em seu livro (Dom Távora, O Bispo dos Operários. Um homem além do seu tempo. SP: Paulinas, 2008.) sobre o arcebispo, o padre Isaias Nascimento destaca que foi o religioso quem concretizou a criação da Província Eclesiástica de Aracaju. Antes, todo o estado de Sergipe era uma única diocese, que se chamava DIOCESE DE ARACAJU. Com a criação da província, surgiram mais 2: as dioceses de Estância e Propriá. Aracaju, como sede da Província, foi elevada a Arquidiocese, tendo Dom Távora como seu 1º Arcebispo;
Ele foi um dos bispos do Brasil que primeiro reagiu à tentativa de golpe que houve em 1961, quando o então presidente Jânio Quadros renunciou e o Exército impediu a posse de João Goulart. Com ele assinaram uma carta em defesa da democracia o governador do Estado e o Presidente da Assembleia Legislativa. Em união com os bispos do Nordeste estimulou a criação de entidades em defesa da classe camponesa: os Sindicatos dos trabalhadores rurais (os mais antigos tinham a foto dele na parede) e com estes surgiu a FETASE;
Foi um grande colaborador do Estado na construção da ANCARSE (atual EMATER) para prestar assistência técnica aos pequenos agricultores de Sergipe. Era um defensor do desenvolvimento econômico do nosso estado: para os camponeses defendia a reforma agrária e para os trabalhadores urbanos estimulou a vinda de fábricas, como a antiga fábrica de cimento da Rua Acre e a de Cerâmica Santa Maria .
A biografia destaca que Dom Távora era pobre e morreu pobre, sem qualquer bem pessoal.
Era um defensor dos direitos humanos e essa sua declaração para o jornal “A Cruzada”, ligado à igreja católica, deixa bem claro isso na edição de 02 de janeiro 1960: “Esta minha posição firme, de guarda e pregador do Evangelho, não me dá direito de permanecer omisso diante de injustiças sociais, assim como não admito o ódio entre os homens e as classes. Acho que, entre os maiores bens que devemos defender, estão a liberdade e a pessoa humana, e devemos fazê-lo não por palavras, mas sim buscando condições para que possam afirmar-se numa sociedade organizada e justa”.
O ex-arcebispo não desprezou nenhum segmento social, não pregou o ódio, mas era clara a sua opção pelos pobres e eles estavam na praça Olímpio Campos, onde fica a Catedral Metropolitana de Aracaju e aconteceu o velório e sepultamento do líder religioso. Foi uma despedida que mobilizou Aracaju e contou com as presenças de religiosos de todos os municípios do Estado
D. Távora faleceu precocemente em 3 de abril de 1970. Em Sergipe adotou como lema episcopal “Meu destino está em tuas mãos”. Ele vinha sendo duramente atingido pelo diabetes e pela hipertensão arterial e isso dificultou reagir a um infarto de miocárdio, que ceifou a sua vida. Faleceu aos 60 anos, deixando obras reconhecidas por todos como importantes em toda a Província Eclesiástica de Aracaju. Fui, puxado por uma tia (Edelzuíta), aos 12 anos, à sua despedida.
Mas desde o seu falecimento circulam entre religiosos seus seguidores, amigos e militantes políticos de esquerda comentários de que o infarto teria sido consequência das pressões sofridas por D. Távora pelos representantes do regime militar fixado no Brasil em 1964, com a derrubada do presidente João Goulart, e que terminou em 1985. Neste período estabeleceu-se a censura à imprensa, restrição aos direitos políticos e perseguição policial aos opositores do regime.