Afonso Nascimento
Professor do Departamento de Direito da UFS
Não faz muito tempo, andei visitando documentos de minha história escolar e me deparei com algumas “surpresas”. A primeira delas foi ver, apoiado nos números, que eu nunca fui um bom aluno. Nunca passei de aluno muito ordinário. Isso foi motivo de alegria para minha sobrinha Catarina, estudante aplicada cujas notas estão sempre entre as melhores. Outra “surpresa” foi descobrir que cursei as disciplinas Educação Moral e Cívica (EMC), Organização Social e Política Brasileira (OSPB) e Estudos de Problemas Brasileiros (EPB).
A disciplina OSPB foi por mim cursada, em 1967, no Ginásio Possidônia Bragança, em Laranjeiras e também no Colégio Costa e Silva, na capital de Sergipe, 1971. Eu tive a oportunidade de estudar EMC também no Colégio Costa e Silva, no Bairro Siqueira Campos, 1970. Quanto a EPB, eu a cursei enquanto estudante de Direito da UFS, por duas vezes, EPB I e EPB II (Prática Educativa de EPB), em 1973 e 1974. Prestando atenção às datas, o leitor se dará conta que essa minha formação ocorreu durante a Ditadura Militar em Sergipe e que ele, se também pertence à minha geração, também recebeu a mesma socialização política para a submissão e para o autoritarismo que eu.
Afirmando isso, estou querendo dizer que, no período do Regime Militar, essas três disciplinas foram impostas aos três níveis escolares para levar a adolescentes e jovens a visão de mundo dos militares que, assim, buscava afastá-los das ideias democráticas, socialistas e comunistas que eles queriam combater – as quais supostamente teriam justificado o golpe de 1964. Se a intenção dos militares e seus ideólogos era afastar os jovens da política, o seu sucesso foi considerável, posto que existe um certo consenso entre membros da classe política brasileira sobre o fato de que, no período de 1964 a 1985, ter havido pouca renovação daqueles que fazem política no Brasil.
Volto às três disciplinas. Educação Moral e Cívica (EMC) era destinada aos estudantes do primeiro grau. Entre os seus objetivos incluía-se aquele de fazer nascer o orgulho pelas coisas brasileiras. Organização Social e Política do Brasil (OSPB) procurava criar entre os jovens a ideia de patriotismo, entre outros pontos. Já Estudos de Problemas Brasileiros (EPB) visava a reforçar ainda mais o patriotismo e mais moralismo, além de atacar obstáculos ao desenvolvimento econômico brasileiro, questões de segurança nacional etc. – e nada de socializar para a cidadania nos sentidos sócio-econômico, dos direitos civis e da participação política.
Segundo o professor aposentado da UFS, Luiz Santana, escrevendo no seu blogue (http://cronicadacidade.blogspot.com.br/2009/09/luiz-santana-historia-de-uma-vida.html), estes foram os professores de EPB da UFS naquela época: “Concluo o curso de Direito em outubro/69 e sou convidado a ensinar a matéria EPB, recém-criada. Prestamos concurso e passamos a ensinar, definitivamente, a matéria. Somos 8 professores: Carlos Britto, Fernando Lins, José Osvaldo, José Antônio da Costa Melo, Antônio Soares de Araújo, eu, e outros que não me lembro”.
Eu não me recordava quem tinha sido o meu professor de EPB na UFS. Quem me ajudou nessa tarefa foi o meu amigo e advogado civilista Lúcio Sérgio Fontes Lima. De acordo com ele, nosso professor foi Luiz Santana, que mais tarde foi transferido para o Departamento de Direito da UFS. Eu não sei quando essa disciplina foi retirada, definitivamente, da grade curricular obrigatória da UFS. Provavelmente ainda nos anos 1980, embora só em 1993 é que EPB foi formalmente posta fora do currículo universitário brasileiro.
A última “surpresa” – na verdade, um susto – dessa pesquisa sobre a minha história escolar foi, entretanto, “descobrir” que, em 1982, depois de ter voltado de Mestrado em Direito em Santa Catarina, eu fui professor de EPB, por um semestre, no curso de Jornalismo da UNIT, no campus do velho centro de Aracaju. Embora eu não tenha sido adepto da ESG ou da ADESG e embora eu possa dizer que, àquela época, professores de EPB (os que se sentiam desconfortáveis com o seu conteúdo) já tivessem autonomia para modificar o conteúdo e a direção do curso, isso não retira a evidência de eu ter sido um professor de EPB. Ainda bem que nunca busquei para a minha vida o ideal de coerência e de perfeição…