Magalu e o enfrentamento ao racismo

Prof. ROBSON ANSELMO – É professor e militante de movimentos sociais em defesa da causa dos afrodescendentes.

São incontáveis os fatos, acontecimentos, situações em que o racismo expõe a sua face. Muitas dessas ocorrências se dão de forma escamoteadas, disfarçadas e com certa “vergonha de se mostrar”. Outras são mais despudoradas, mais agressivas e violentas. Estas cada vez mais vem se manifestando na atual quadra protofascista que estamos sendo submetidos.

A primeira forma de manifestação do racismo quase sempre ocorre nas relações cotidianas, nas mais variadas dimensões da vida social e quase sempre passam despercebidas pelas pessoas, inclusive, pelas pessoas negras, que são as vítimas do racismo à brasileira. São situações que se tornaram naturalizadas. As piadas de mal gosto, as frases de efeito e depreciativas, as referências estéticas desqualificadoras, os adjetivos que suprime a humanidade de homens e mulheres negras de todas as idades.

A voracidade que o racismo assume nas diversas sociedades, sendo mecanismo causador de guerras entre as nações e conflitos entre comunidades, no Brasil, chegou-se mesmo a “tolerar” as manifestações menos midiáticas do racismo. Isso fez com que as manifestações aumentassem e quanto mais se tolera, mais avoluma-se e mais se naturaliza. E quanto mais o racismo é inserido num ciclo vicioso de normalidade, mais voraz ele se torna.

Na semana passada a comunidade negra brasileira chagou as telas das redes sociais e as pautas da imprensa tradicional geradas pelo fenômeno do racismo. O Grupo MAGALU anunciou o seu Programa de Trainee 2021 que será para atender especialmente jovens negros, numa perspectiva de corrigir as assimetrias de representação de negros e brancos na estrutura de comando da própria empresa.

Ao anúncio do Grupo Magalu levantaram as vozes dos reconhecidos brancos da nossa sociedade reverberando o grito de que a empresa está praticando racismo reverso. Mais uma vez o éthos branco, patriarcal, dominador e bárbaro se manifesta em defesa do que eles acreditam ser seus direitos assegurados pela legislação e legitimados pelo costume.

Sempre pontuamos que o racismo é um problema da sociedade brasileira e a sua superação não é unicamente tarefa dos negros. Deve ser um compromisso de negros e não negros, na perspectiva de uma sociedade mais equânime.

O caso protagonizado pelo Grupo Magalu é exemplar no que se refere ao comportamento da população não negra no Brasil. O segmento da população não negra  que fez caminhada nas ruas de Aracaju contra o Programa de Ações Afirmativas da UFS, que representou ao STF o pedido de inconstitucionalidade da Cotas no Ensino Público Superior, agora não disputa somente no campo da política pública estatal. Para não permitir o mínimo de acesso ao povo negro, também reivindica a sua supremacia também nas diretrizes das empresas privadas.

A reação do Grupo Magalu ao ato reacionário e racista deve ser exaltada por todos que aspiramos uma sociedade em que negros e brancos tenham as mesmas oportunidades e ocupem os espaços considerando somente o critério das qualificações profissionais e escolares. Ao adotar o seu Programa de Trainee, ao manter as diretrizes do Programa voltado para jovens negros e ao tornar visível o racismo predominante, o Grupo MAGALU, ao ser acusado de prática de racismo reverso, reverte a acusação aos acusadores. Pois, referir-se ao racismo reverso, reconhece-se a prática histórica do racismo contra o povo negro.

Todos que desejamos a superação das mazelas devemos exaltar esse exemplo do Magazine Luiza que expressa compromisso com uma nova ética, com uma sociedade diversa, plural, interétnica , solidária e fraterna.

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