José Carlos Santana de Oliveira – Cardiologista clínico e ex-professor do curso de medicina da UFS
Foram registrados mais de 30.000 óbitos por Doenças Cardiovasculares no Brasil no período de 16 de
março até 30 de junho deste ano, cerca de 30% superior ao mesmo período de 2019, com um
expressivo aumento estimado em 75% de óbitos domiciliares segundo dados da Associação Nacional
dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil) em parceria com a Sociedade Brasileira de
Cardiologia (SBC). Essa trágica estatística pode ser explicada pela menor procura das pessoas aos
serviços de saúde com o receio em adquirir o covid nesses ambientes e pela redução da oferta dos
serviços médicos ambulatoriais aos pacientes potencialmente de alto risco para Infarto do Miocárdio,
Arritmias, Acidente Vascular Cerebral dentre tantas outras causas de Morte Súbita.
O novo coronavírus é uma doença que, primariamente, atinge as vias respiratórias, mas que apresenta
um espectro clínico muito amplo e, em alguns casos, ataca diretamente outros órgãos como o coração
determinando uma inflamação do músculo cardíaco denominada miocardite com potencial capacidade
de causar ou acentuar disfunções do órgão. Pode também desencadear fenômenos trombóticos,
levando a Síndromes Coronarianas Agudas (IAM) e Acidentes Vasculares Cerebrais (AVCs).
Muitas pessoas, principalmente aqueles da terceira idade, já apresentam comorbidades envolvendo e,
de algum modo, fragilizando os “órgãos-alvo” do covid, tais como a doença aterosclerótica
principalmente entre os diabéticos, portadores de níveis elevados de colesterol, hipertensos, renais
crônicos e fumantes; arritmias cardíacas, também comuns a esses grupos de ateroscleróticos tornando-
os muito mais vulneráveis a desenvolveram complicações graves quando acometidos pela virose.
O isolamento social tem permitido a descontinuidade de medicamentos (tratamentos) imprescindíveis
para pacientes crônicos e aumentado alguns importantes fatores de risco para doenças cardiovasculares
como o tabagismo, o etilismo e o sedentarismo; além do incentivo a automedicação, com drogas
potencialmente tóxicas, estimulado pelas informações, sem sustentáculo científico, que circulam nas
redes e nos encontros sociais como “drogas milagrosas para a prevenção e cura” do novo coronavírus.
Teremos como ato contínuo uma avalanche de novos diagnósticos e da descompensação de doenças
crônicas que tiveram sua evolução acelerada por falta de monitoramento, interrupções de terapêuticas
ou retardo nos diagnósticos, impostas pela pandemia, com sérias e imprevisíveis repercussões em toda
a cadeia de saúde com acentuação do já seríssimo desalinho social.